quarta-feira, 8 de junho de 2011

Insânia - Parte 5


O maldito jogo terminou com a vitória por três gols a zero do Foot Ball sobre o Nacional, para comemorar mais uma derrota Roger G. decidiu abrir uma garrafa de vodka, uma vez que o vinho acabara, decidiu que era hora de algo mais forte, a cabeça a essas alturas já estava em ponto de ebulição, seu hálito era quase volátil, devido a quantidade de álcool insana que ele havia ingerido, sentiu que suas pálpebras começavam a ficar pesadas, sacudiu a cabeça, tratou de se levantar, cambaleou, apoiou-se no braço do sofá, sentia-se nauseado, o estômago era um embrulho, as pernas pareciam feitas de gelatina, a visão embaralhada, era hora de reagir pensou ele, sim a auto piedade já o afogava, e daí que fosse quarta-feira? Olhou para si, estava um trapo, atirado as moscas, tomou a direção do banheiro, o pequeno apartamento que alugava cheirava estranho, fazia seis dias que ele não o arejava, olhou para fora com os olhos pequenos e desacostumados com a claridade, já estava escuro, não saberia precisar a hora, mas já era noite, coisa que no verão deveria corresponder a algo perto das nove horas da noite, uma boa hora pensou G. tomo um banho, me arrumo um pouco converso com alguns amigos e sigo a noite tomando refrigerante para começar a me recuperar! era um pensamento simplista, mas não deveria ser assim que as coisas aconteceriam, Roger G. sabia que não seria fácil, mas o primeiro passo estava dado, uma tentativa de reabilitação, chegou ao chuveiro e despegou-se de sua única peça de roupa até então, a cueca amarelada impregnada de suor e de respingos de bebida foi atirada em um canto, provavelmente ficaria ali até que apodrecesse, já que uma empregada era um artigo de luxo que G. no momento não poderia pagar. Ainda trôpego apoiou-se no box do banheiro, tratou de correr a porta por cerca de quarenta segundos, até conseguir clarear a mente e ver que tentava puxar a parte fixa, achando que era a porta de correr, a bebida o fizera perder a percepção e a noção da certeza acerca dos objetos, podia jurar que haviam coisas no banheiro que mudaram de lugar, e outras que ele jamais havia visto, sentou-se no vaso sanitário, a cabeça baixa, colocou as mãos na cara e esfregou, voltou a olhar tudo o que havia a sua volta, decidiu que se sentia bem, já que nada novo surgira e tampouco trocara de lugar, pôs-se em pé novamente, apoiou uma mão na parede limenta do banheiro, conseguiu postar a outra mão sobre o registro, virou e ... nada, não saía uma mísera gota d’água, chacoalhou o chuveiro, abriu o registro ainda mais, voltou a sentar-se no vaso, se Roger G. não tivesse se isolado do mundo, saberia que exatamente naquele horário a prefeitura de Mengálvia realizava manutenção nos canos d’água da região do porto, se tivesse esperado mais meia hora poderia ter tomado seu banho, se tivesse acionado a descarga, poderia mais tarde ouvir o som da caixa se enchendo, mas ao invés disso decidiu que deveria embebedar-se mais um pouco, saiu nú do banheiro e voltou ao chão da sala, sentou-se, tomou mais um gole da vodca, olhou para o osso de galinha atirado ao chão, nem sinal das baratas, lembrou que tinha uma carteira, embora fizesse seis dias que não tocava nela, tateou em volta e se deparou com a calça social que jogara ali na noite em que fora despedido, encontrava-se no encosto do sofá, puxou a calça por uma perna, a fivela do cinto o cararranhou, de leve sem machucar, sentiu o peso da carteira no topo da cabeça, precisou de quase um minuto e meio para encontrar o bolso onde estava, e revirou pelo menos oito vezes cada bolso, até achar o correto.

terça-feira, 7 de junho de 2011

Insânia - Parte 4


Por hora decidiu esperar, precisava ocupar seu cérebro que, devido a bebida em demasia, doía como em tempos ancestrais. A dor parecia penetrar até os ossos da caixa craniana, lembrou do jogo que passaria na TV Estatal, louvado seja Charles Johann Walcker! O governador criara a TV Estatal para que a população mais pobre tivesse acesso a divertimento. Com a totalização das TV’s pagas, a Estatal era a única rede de TV aberta, e se esforçava para ser melhor que as TV’s pagas. Transmitia agora o jogo da final estadual, o cérebro ordenou mandou sinapses aos neurônios, a essa altura danificados pela bebida, e tentou entender na sua confusão mental se o time do coração, o Nacional, vencia ou não o Foot Ball, quando conseguiu entender, deu-se conta que o Nacional perdia de dois a zero para o arqui-inimigo Foot Ball.
Olhou, um pouco sem entender, o que se passava. Dois ópios em um, televisão e futebol, uma é formadora de opiniões, o outro de lunáticos, nos tempos da televisão aberta, ela mandava no que você deveria pensar, era capaz de fazer com que se tomassem decisões baseado no que seus comentaristas diziam, atacava ou protegia governos de acordo com os seus interesses, mentia, manipulava, omitia, mostrava a verdade que lhes convinha, e nunca pedia desculpas pelos seus erros, esmiuçavam a vida de qualquer um, e quando viam a inocência da vítima, a abandonavam, sem direito de defesa, como chacais depois que se desinteressam por sua presa depois de acabar com ela, e a deixam como chacota para as sorridentes hienas! E as hienas eram piores, viviam de sobras, de verdades absolutas do que se dizia no deus de ondas analógicas! Deveria ser deus de ondas ilógicas, nunca se podia confiar na televisão, ela que deveria esclarecer de um tempo para o outro, não se sabe dizer exatamente onde, teria ficado humana demais, pois não se podia mais confiar no que ela dizia, a televisão era capaz de deixar pessoas cegas, surdas e mudas, afinal para que pensar? Ela fazia isso por você, que tem a mente fraca, totalmente manipulável, um verdadeiro tevidiota, ah que termo interessante, a televisão como agente idiotizador, era a máquina perfeita de criar imbecis! Louvado seja o Senhor Governador Charles Johann Walcker! Nos deu ao menos uma televisão um mínimo decente, tem tudo o que as outras tem, violência, esportes e pornografia, mas em horários que crianças não a vêem. Existem também os telejornais, mostram as “maravilhas” da administração, claro que não deixa de fazer rápidos registros sobre a oposição, ao menos não esmiúça a vida de inimigos, como da vez que o maior crítico do PNS, o partido do governador, foi pego extorquindo prostitutas em  um motel clandestino, uma batida policial  o decobriu. Comenta-se que o próprio governador interveio para que a notícia não fosse veiculada na TV Estatal, o mesmo não pode se dizer dos jornais, mas como se tratava de um figurão, a notícia não foi muito adiante, é capaz que este mesmo figurão seja eleito nas próximas eleições, as pessoas tem memória curta para a política.
Mas o mais incrível é que hoje, apesar de tudo, a TV talvez seja a única maneira de reunir uma família, é provável que esta caixinha seja uma das poucas coisas que se pode chamar de lazer coletivo, as famílias se reúnem para ver um programa que tem o intuito de transformá-la em uma alienação institucional. O que terá acontecido com as velhas mesas de jantar?com passeios? com viagens e afins? Será que é só na frente de uma televisão que marido e esposa podem ficar juntos e ter romances inverossímeis? Será que o único momento em que irmãos deixam de brigar é para assistirem os seus programas favoritos em comum? Isso caracteriza outro problema, a televisão é a babá do século vinte e um, ela repete bordões centenas de vezes, passa desenhos cada vez mais violentos, estimula a competição e explode monstros gigantes, e os ´pais se preocupam? Doce ilusão, por óbvio que não, enquanto elas estão na frente da televisão, ficam quietas, e isso para eles compensa qualquer coisa.
Hoje as atividades entre pais e filhos são resumidas a ficar frente a uma televisão vendo futebol, e este último é um outro fenomeno que ainda precisa ser explicado, se é que existe uma explicação.
Nenhum filósofo seria capaz de explicar essa paixão, essa vibração, essa entrega de um homem por uma paixão eterna, nenhum filósofo explicaria! Ah que saudades de Aristóteles, de Platão e de bons filósofos!
O futebol é uma espécie de televisão, também deixa as pessoas cegas, surdas e mudas, mas de paixão, o futebol não pensa por ninguém, pelo contrário às vezes faz com que deixemos de pensar, nos guiamos por um sentimento de devoção que acredito que nenhuma religião no mundo tenha, os islâmicos tem de ir à Meca ao menos uma vez na vida, no futebol não ir ao estádio regularmente é quase uma heresia, é algo impensável, o torcedor de verdade é fervoroso, engajado, imutável! Soa quase ridículo sofrermos por uma instituição, sim, pois os atletas jamais serão sempre os mesmos, quem paga mais compra o melhor jogador, mas não compra os melhores torcedores, isso não tem preço, é algo de nascença, Então torcemos por um símbolo, para uma ou mais cores e odiamos com todas as forças as cores do adversário, torcemos por uma história, por uma superação nossa por sobre outra paixão, algo um tanto quanto irônico, todos recorremos a Deus, quando nossos times vão mal, mas, será que o Deus do meu time é mais forte que o Deus do time adversário? É uma pergunta cretina na verdade, e a verdade é que somos influenciados desde o berço, com roupas, com bolas, camisetas e apetrechos do time do coração de nossos pais, e qual seria a pior coisa para um pai? Ver seu filho torcendo pelo outro time, é interessante, não há ainda nada que explique o que leva um cidadão comum a deixar o conforto de seu lar para gritar como um louco e incentivar onze homens usando uniformes iguais e com números diferentes, que ganham salários no mínimo cem vezes maior do que qualquer cidadão comum, e alguém acha que isso importa? Claro que não, do mais rico ao mais pobre, todos são mobilizados por este esporte, os assuntos em mesa de bar são sobre futebol, as piadas de segunda-feira são sobre futebol e as vezes mortes são em nome dos deuses da bola. Vinte e dois homens correndo atrás de uma bola e intentando chutá-la entre três traves, realmente não me entra na cabeça,
- Vamos Nacional! Merda de time!
Mais uma vez evoco o nome do Governador, nos deixa ver jogos sem precisar sair de casa, ele que com dezessete anos fez o gol que deu o título mundial de juniores para o Foot Ball, louvado seja!

Insânia - parte 3


Roger G. suspirou, coçou o tornozelo que estava envolto em uma espécie de sebo, resultado da pele morta que se acumulara devido a falta de banho e ao suor, sentiu-se contente por ter ferido a inimiga, tomou mais um gole de vinho, já não sentia o corpo unamente, parecia que seus órgãos internos estavam espalhados pela sala, os sentia frios e sujos, e o cérebro flutuava fora da caixa craniana, doendo! Voltou a ouvir barulho, achava que eram elas voltando, o barulho parou e G. exprimiu toda a sua insatisfação em relação a suas novas inquilinas. Malditas baratas!
Baratas são seres detestáveis, é provavel que detestamo-as mais ainda pois sabemos que são as últimas sobreviventes que ficariam após uma catástrofe nuclear, era ruim pensar que nós evolumanos não resistiríamos a isso enquanto que essas maledicências de multipatas sobreviveriam, no lixo em que se reproduzem é quase incrível acreditar que sejam tão resistentes, se alimentam de sobras, esgueiram-se pelas casas a noite, é repugnante pensar que elas caminham por cima de tudo e que depois nós usamos essas coisas que elas pisoteiam, sera que naftalina ainda resolve?
o que importava agora a droga da naftalina? Seus antepassados eram caçadores, e era assim que acabaria com elas, por meio de uma caçada, uma guerra de nervos, os mais fracos sucumbiriam primeiro, tinha certeza que não seria ele o primeiro. Não desta vez, sempre fora o mais fraco do grupo de escola e do de amigos, era sempre ele que cansava primeiro, era sempre ele o primeiro a ir dormir, mas as baratas não seriam páreo para ele, elas haviam ido enmora, mas ele as esperaria, sabia que era só questão de tempo até que sentissem fome e voltassem para se confrontar com ele.