terça-feira, 24 de maio de 2011

Tempo - Parte III


Com tanto sucesso,foi possível determinar horários, uma vez que o prefeito já não podia despachar em paz, pois sempre havia alguém para tentar tocar-lhe os pés, fosse a hora que fosse.
            O Senhor Magalhães começou a se interessar por outros investimentos, ao ver que as pessoas se cobriam com lonas, descobriu que os mengalvianos estavam mais atrasados do que poderiam supor, e quando perguntou a um transeute que saia da parte chuvosa para a seca, se conheciam o guarda chuva, este o olhou com cara de espanto e lhe perguntou:
            - Guardar aonde? Em potes?
            Resolveu fabricá-los de forma artesanal, e por óbvio ganhar dinheiro com isso, e quando se soube da novidade, e testemunhas juraram que um homem havia saído do seco para a parte molhada e havia voltado com noventa por cento do corpo seco, foi um sucesso de venda, espalhou-se a novidade, e as vésperas do jogo entre o Nacional e o Foot Ball, o time vermelho do Nacional, formado por descendentes de noruegueses, resolveu comprar guarda-chuvas para todos os seus atletas, que seriam obrigados a jogar pelo menos um tempo em baixo de chuva, e quando ofereceu-se o guarda-chuva ao time azul do Foot Ball, formado por italianos e espanhóis, estes responderam que não usavam coisas de maricas, e que jogariam até de baixo de uma chuva de canivetes, quando inventassem estes, pois queriam ganhar, e não se preocupar com o garboso uniforme. Era verdade, o Foot Ball venceu por sete a zero, e os presentes, que preferiram o lado seco do campo, se riam muito quando os jogadores do Nacional chegavam ao lado seco, pois se desocupavam da bola, para fechar seus guarda-chuvas. E mais hilário ainda foi o goleiro que num descuido, preocupado em ajeitar a sua boina, levou um pelotaço que o jogou com guarda-chuva e bola para dentro de uma das goleiras. Os jogadores do Nacional atribuíram a derrota aos azarentos guarda-chuvas, convencidos de que abri-los em qualquer parte dava azar.
             Enquanto o pé direito do prefeito era endeusado pelos quatro cantos da cidade, e das províncias próximas, trazendo gente de tudo quanto era lugar, e a chuva continuava a cair tristemente, esta parecia cada vez mais palpável, penetrante no pensamento, e assim o foi, estranhas formas começaram a ser encontradas pelos cantos chuvosos da cidade, fragmentos de histórias antigas, objetos perdidos e desejados com desejo secreto, pessoas longiquas que de uma hora para outra materializavam-se aquosamente em qualquer canto da cidade, mas sempre próximos de onde se havia pensando com maior fervor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário